domingo, 31 de maio de 2015

MENSAGENS DOS PRETOS-VELHOS DA UMBANDA

A Vitória


Guilherme estava indo para o centro umbandista que freqüentava há pouco mais de seis meses e onde ocorreria, naquela noite, uma gira de preto-velho em que ele teria a gratificante oportunidade de cambonar mais uma vez a Pai Guiné do Congo.

Guilherme era um jovem universitário que procurava desenvolver as atividades do centro com a maior boa-vontade possível.

Auxiliava àqueles que eram atendidos pelo preto-velho e sempre, após o último atendimento, Pai Guiné solicitava ao jovem que sentasse a sua frente para trocarem alguns “dedos de prosa”. Eram nestes momentos que Guilherme mostrava à entidade o sentimento e a idéia de que ser umbandista é ser sempre um vitorioso, como podemos observar no diálogo que se segue:

— Salve Zambi, menino Guilherme! Como vai suncê?

— Salve Deus, Pai Guiné!!! Melhor do que estou seria impossível!!!

— E, por que, zifio?

— Desde que entrei na Umbanda só conheci vitórias: minhas notas melhoraram, parei de farrear e encontrei uma menina incrível pra namorar que é médium da corrente deste terreiro.

— Olha zifio, Nêgo fica feliz com sua alegria no desabrochar de sua descoberta de qual é a real felicidade de ser umbandista.

— Olha meu pai-velho, para mim, ser umbandista é ser vitorioso sempre e, se Deus quiser, eu vou vencer ainda mais nesta vida!!!

— Zifio, de fato, ser umbandista é ser vitorioso sempre, desde que se saiba o que é vitória!

— Como?

— O que é vitória pra suncê, meu filho?

— Para mim vitória é vencer, alcançar aquilo que se quer!!!

— Suncê inté que tá certo, mas como se vai saber se aquilo que suncês quer, é aquilo que vai fazer suncês vencer???

— Não entendi!!!

— A sabedoria meu menino!!! É ela o instrumento com que Deus dotou cada ser humano afim de que ele, ao exercê-la, seja sempre um vitorioso em qualquer situação que enfrente na vida.

— Ainda não consegui entender, Pai Guiné!!! O senhor está meio enigmático hoje!!!

— Num se preocupe não zifio, pois nas forças de Zambi no tempo certo suncê há de entender!!! Agora Nêgo deve dizer que tá muito ditoso com o namoro entre suncê e a “cavalinha” Gabrielle!

— Mesmo?

— Sim meu fio, pois ela é uma fia tão formosa que é capaz de fazer os zifios crescer moralmente só pelo fato de estarem juntos dela e aprenderem com seus exemplos práticos de amor, bondade e caridade!!!

— Para mim ela é quase uma santa!!!

— É por que suncê só tá vendo ela, nestes três meses de relacionamento, com os olhos do amor, mas em breve o tempo o fará vê-la como é: imperfeita, mas portadora de virtudes morais e edificantes!!!

— Se o senhor diz, eu acredito, mas será que eu poderia tocar em um outro assunto?

— Fique a vontade zifio!!!

— É que eu gostaria de uma ajuda para alcançar mais uma vitória através da Umbanda!

— Qual ajuda?

— É que eu estou muito interessado em uma vaga de estágio numa grande firma de advocacia!

— Vamos ver né zifio, pois só Zambi Nosso Pai é que pode todas as coisas!!!

Guilherme continuou cambonando a entidade e três semanas após o diálogo em questão podemos vê-lo travar uma nova conversa com Pai Guiné do Congo:

—Puxa vovô, eu estou muito feliz por ter obtido minha vitória!!!

— Conseguiu a vaga zifio?

— Graças a Deus, alcancei minha vitória!!!

— Peça sempre sabedoria a Zambi para que esta vitória não seja uma derrota na sua vida!

— Pode deixar vovô, pode deixar!!!

Um ano após esta conversa, encontraremos Guilherme a ter uma nova conversa com o preto-velho:

— Pai Guiné, continuo vencendo na Umbanda, alcancei nova vitória!!!

— Como assim, zifio?

— Comprei um carro usado, mas que está tão bonito e ajeitado que parece novo, agora a vida vai ficar mais fácil com esta minha conquista!

— Zifio, peça sempre sabedoria a Zambi para que esta vitória não seja uma derrota na sua vida!!!

— Pode deixar vovô, pode deixar!!!

Três meses após esta prosa lá estava o jovem Guilherme em mais um “bate-papo” com Pai Guiné:

— Vovô, é capaz até de o senhor ficar triste, mas eu consegui vencer de novo por meio da Umbanda!!! Terminei com a Gabrielle e estou namorando com uma menina da minha turma na faculdade e que me entende melhor; o nome dela é Valquíria.

— Zifio, peça sempre sabedoria a Zambi para que essa vitória não seja uma derrota na sua vida!!!

— Pode deixar vovô, pode deixar!!!

Quatro meses depois Guilherme, abatido, estava novamente a dialogar com o pai-velho:

— Pai Guiné, tive minha primeira derrota desde que sou umbandista!

— Conta pra Nêgo o que aconteceu, meu menino!!!

— Olha, sem eu dar motivo algum, fui dispensado do meu estágio!!!

— Zifio, peça a Zambi nosso Pai que faça você ver a vitória que esta derrota é na sua vida!!!

— Como?

— O umbandista é sempre vitorioso zifio!!! Lembra quando nóis conversou sobre isso?

— Lembro sim vovô! Pode deixar que eu vou fazer isto vovô, pode deixar!!!

Três semanas após, Guilherme está outra vez em frente a Pai Guiné a dizer-lhe:

— Pai Guiné, apesar das minhas rogativas a Deus o meu pai desenvolveu uma grave doença e não tem muitas chances de cura!!!

— E na visão de suncê isto é uma vitória ou uma derrota?

Guilherme pensou profundamente antes de responder a entidade, mas só conseguiu dizer:

— Desculpa Pai Guiné, mas para mim é uma derrota!

— Num precisa se desculpar zifio, Nêgo gostou da sinceridade!!! Mas peça a Zambi nosso pai que faça você ver a vitória que esta derrota é na sua vida!!!

— Eu vou fazer!!! Pode deixar vovô, pode deixar!!!

Cinco meses depois Guilherme está de frente a Pai Guiné para ter com ele aquela que, na opinião do jovem, seria a última conversa que teria com a entidade:

— Vovô, graças a Deus, o meu pai já está praticamente curado, mas é que eu acabo de sofrer a maior derrota da minha vida e vim até aqui comunicar ao senhor que vou pedir desligamento do terreiro hoje!!!

Guilherme chorava muito e o pranto era copioso. Pai guiné estalava os dedos enquanto aguardava as emoções do seu pupilo serenarem. Poucos minutos depois a entidade retomou o diálogo:

— Suncê pode dizer pra Nêgo que derrota foi essa meu fio?

— Para que vovô? Para o senhor dizer que a minha derrota é vitória?

— Se o zifio tá zangado e for pra aliviar a dor do seu coração, suncê ta autorizado a fazer malcriação com Nêgo até ficar aliviado, mas depois que suncê tiver falado tudo; Nêgo vai pedir silêncio para que suncê possa escutar tudo o que ele tem a dizer, tudo bem?

— Desculpe Pai Guiné, o senhor pode falar agora que eu escutarei!!!

— Suncê tem certeza?

— Sim senhor!!!

— Então Nêgo vai conversar com suncê, meu menino!!! O zifio tá zangado por que a “rabo-de-saia” Valquiria, vendo que não tinha mais o que sugar de suncê, terminou o namoro, não é?

Boquiaberto, Guilherme respondeu:

— Sim senhor!

— Suncê num tem mais o carro porque teve que vender para ajudar no tratamento do seu pai, não tem mais dinheiro por que está sem emprego; e sem carro e sem dinheiro ela não te quis mais, não é verdade?

— Sim senhor!

— E isto foi uma derrota ou uma vitória em sua vida?

— Agora com o senhor falando assim deste jeito eu, sinceramente, não sei!!!

— Então vamos começar do inicio, certo???

— Certo!

— Um tempo atrás suncê procurou Nêgo pra dizer que tinha conseguido uma vitória que Nêgo sentia que poderia ser uma derrota em sua vida, lembra???

— A vaga de estágio na firma conceituada de advocacia?

— Exatamente!!! Esta vitória não deveria, mas foi uma derrota na sua vida pelo que o motivou prioritariamente a alcançá-la!!!

— Como?

— Comprar um carro, não era o que suncê mais queria?

— Mas isso é ruim?

— Depende do que motiva prioritariamente uma pessoa a adquirir um carro, o que nos leva a segunda vitória que não deveria, mas foi uma derrota em sua vida!!!

— Como?

— Não foi o desejo ardente de impressionar Valquiria e tê-la apenas para si que o motivou prioritariamente a comprar o carro?

— Sim, mas isto é ruim???

— Zifio, isso levou suncê a terceira vitória que não deveria, mas foi uma derrota em sua vida!

— Como assim?

— O desejo de impressionar e ter para si uma mulher de beleza rara e extasiante foi o que fez você abrir mão do relacionamento com a fia Gabrielle, certo?

Boquiaberto, novamente, Guilherme respondeu:

— Sim senhor!

— Suncê abandonou uma fia que só fazia compartilhar para ficar com outra que só queria tudo pra si, isso foi derrota ou vitória?

— Meu Deus!!! Foi por isso que fui mandado embora do estágio: por estar fazendo tudo errado!!! Por isso eu tive minha primeira derrota!!!

— Menino Guilherme, aquilo que suncê chama de primeira derrota foi, na realidade, sua primeira vitória!

— Mas, por quê?

— Por que você estar desempregado proporcionou-lhe a oportunidade de assistir melhor e por mais tempo ao seu pai na ocasião do adoecimento dele!

— Meu Deus!!! Olhando por este lado eu vejo que o senhor tem razão!!!

— E, quando seu pai adoeceu, aconteceu aquilo que suncê chamou de segunda derrota, mas que foi, na verdade, sua segunda vitória.

— Vitória? A doença do meu pai foi vitória?

— Não, mas proporcionou-lhe uma sensibilização na sua vida que o ajudou a sentir e pensar a vida e o amor de uma forma moralmente mais elevada, ou não é verdade que você quase terminou o relacionamento com a Valquiria por três vezes, devido ao excesso de materialismo por parte dela?

— É verdade vovô, é verdade!!!!

— Suncê foi intuído por seus mentores para terminar o relacionamento com ela, mas como a beleza e o envolvimento carnal foram maiores que o seu bom senso, eis que suncê obteve a sua terceira vitória que foi o término da relação só que por iniciativa dela; e logo agora que suncê tá tão perto de conseguir uma vitória crucial pra sua evolução, suncê pensa em largar a sua fé? Nêgo num entende!!!!

— Vitória? Vitória sobre o que? Sobre o desemprego? Sobre o desamor?

— Não meu menino, nas forças de Zambi, há de ser uma vitória sobre suncê mesmo: sobre suas más tendências, sobre a ilusão da matéria e sobre sua ignorância acerca da beleza do espírito. Vitória não é só conseguir o que se deseja, pois se suncê pedir a Zambi e desenvolver a sabedoria, suncê verá a real vitória em todas as situações de sua vida: até mesmo nas derrotas aparentes, suncê entende meu fio?

— Estou entendendo vovô!!!

— Sem sabedoria vencer é só alcançar aquilo que suncês quer, já com sabedoria vencer é encarar as dificuldades da vida como oportunidades sagradas de Deus para a evolução de suncês, pois se isto for alcançado a vitória é certeira, mesmo que aos olhos do mundo seja a mais flagrante derrota, suncê entende?

— Estou entendendo, sim senhor!!!

— Por isso o verdadeiro umbandista vence sempre: por que pede sempre a Zambi que o faça enxergar todas as situações da vida com a visão espiritual da sabedoria!

— É verdade vovô!!!

— Neste mundo tão materializado e ilusório somente o olhar da sabedoria espiritual pode vislumbrar os caminhos que levam suncês a real vitória que, por sua vez, não é aquela sobre o próximo ou sobre a carne, mas sobre suncês mesmos, suncê entende meu menino?

— Sim senhor!!!

— Suncê ainda quer sair do terreiro pelo que lhe parece uma derrota? Ou quer continuar na sua fé aprendendo, a cada gira, a enxergar os fatos com a visão espiritual através dos “óculos” que vem da sabedoria infinita de Zambi nosso pai?

E com o coração e a mente transformados pela misericórdia de Deus foi que Guilherme respondeu:

— Eu fico com Deus, fico com o senhor, fico com Jesus, fico com os orixás, fico com a Umbanda e tudo com muita felicidade!

E talvez para trazer um pouquinho mais de paz para o coração de Guilherme, foi que Pai Guiné do Congo lhe disse:

— Vamos aprender a vencer sempre?

— Vamos, mas como?

— Fazendo aquilo que Nêgo explicou pra suncê: pedindo a Zambi nosso pai o desenvolvimento da sabedoria!

— Mas como é que se faz isso?

— Tem um jeito muito simples, que foi ensinado pelo próprio mestre Jesus!

— É uma prece?

— É!

— O senhor me ensina?

— A prece fio já conhece, agora o fio deve começar a fazê-la direcionando-a não mais apenas pela memória, mas pelo pensar e pelo coração. Suncê ta pronto?

— Sim senhor!!!

— Então vamos: feche os olhos, relaxe o corpo, esvazie sua mente, concentre-se nas batidas de seu coração e chame Deus para junto de si conectando-se a Ele através da seguinte prece:

“Pai nosso que estais no céu,
santificado seja Vosso nome,
venha a nós o vosso reino,
seja feita a Vossa vontade,
assim na terra como nos céus…”


Texto escrito por Pedro Rangel.

quinta-feira, 21 de maio de 2015

A MÁGICA E A MAGÍA

Antes de mais nada: magia não é mágica. Mágica é o que se faz em shows. Defino magia como sendo: a manipulação de energia pelo ser humano para conquistar um determinado objetivo. Os africanos, assim como nossos aborígenes e muitos outros povos, eram animistas, isto é, atribuíam espírito a todos os fenômenos naturais e procuravam efetivá-los por meio de práticas magistas. Ao contrário do que se pensa, os africanos cultuavam, e continuam a cultuar, um só Deus, Olodumarè. Associavam suas vidas à vida da natureza numa comunhão entre Orísá e Homens. Temiam e amavam a água, que os afogava, mas que aplacava sua sede e fazia com que as plantas crescessem. Temiam e amavam o fogo que os queimava, mas espantava as feras e melhorava seus alimentos. Temiam e amavam o sol que secava a terra, mas os iluminava e aquecia. As plantas, que curam, mas também matam, os ventos fortes, os raios, e assim por diante, tudo na Natureza é divino. Repare que já podemos extrair um conceito muito importante: a energia, se a imaginarmos como uma linha, age diferente em cada ponto dessa mesma linha, mas é a mesma linha, a mesma energia. Ao examinarmos o fogo, o elemento fogo, perceberemos que ele queima. A energia fogo não sabe, não tem como saber, se está queimando uma vela, lenha em uma fogueira, lareira ou fogão ou se está destruindo uma casa ou floresta, portanto não é cenciente (não tem consciência), não pensa. A energia fogo faz isso, muda as coisas através da queima e, se aliada à magia, a transmuta. Se nós podemos atear fogo em algo ou apagar um fogo, significa que podemos manipular o fogo e, se soubermos como, poderemos também manipular a energia fogo. Essa manipulação da energia é magia! Já se sabe que nada acontece por acaso e todos os fenômenos da natureza (Orísá) têm uma explicação lógica. Consequentemente, os fenômenos podem ser estudados e manipulados, alterados, propiciados, estimulados ou impedidos. Para isso basta que a energia seja conhecida e corretamente manipulada. Já que estamos falando em magia, vou aproveitar para deixar outro conceito. Na nossa religião manipulamos energia o tempo todo, portanto fazemos magia o tempo todo e existem dois tipos básicos de magia: a que chamamos Magia Branca e a que chamamos Magia Negra, todas as demais derivam de uma dessas duas. Qual a diferença entre elas? Ao contrário do que se diz e do que nos foi deixado por outras religiões, a diferença não está no resultado, ou objetivo a ser alcançado, nem na intenção com que se faz. Acompanhe o raciocínio. O bem maior dado pela Causa da Criação, Olodumaré, a todos os seres do Universo foi o Livre Arbítrio, o direito à escolha. A grande maioría dessas escolhas são feitas perante o próprio Olodumaré quando estamos nos preparando para a encarnação, portanto ninguém tem o direito de interferir no Livre Arbítrio ou nas escolhas que cada um fez antes de encarnar. É um bem supremo que todo ser possui, inclusive o ser humano. Se alguém, seja lá quem for, se achar no direito de decidir o que é melhor ou não para outro estará desrespeitando esse Bem que Olodumarè lhe deu, portanto não estará agindo em conformidade com as Leis Cósmicas, que são Leis Divinas. O que eu ou você julgamos ser correto ou melhor para outro não é necessariamente verdadeiro, ou pode ser verdadeiro em determinado momento ou situação, mas não em outro, portanto é uma questão de julgamento pessoal. Assim sendo, para que você, eu ou qualquer um ajude outra pessoa e que essa ajuda seja realmente boa, seja Magia Branca, será necessário respeitar o Livre Arbítrio dos outros. Portanto, para se ajudar alguém é necessário que essa pessoa queira real e verdadeiramente ser ajudada, pois só assim o livre-arbítrio estará sendo respeitado. Varias vezes recebi mães desesperadas pedindo para separar a filha de um namorado que "não presta". Em outras recebi pessoas querendo a qualquer custo ficar com a pessoa que "amam". Muitos devem pensar que o primeiro pedido é meritório de ajuda, mas não o segundo. Pergunto: qual a diferença entre os dois pedidos? Eu mesmo respondo: nenhuma diferença há! Nos dois casos são pessoas querendo interferir, forçar, atitudes na vida de outros. Há quatro coisas que devem acontecer para que a ajuda exista de fato e não vá contra o livre arbítrio de outro (nem do ajudado, nem do “ajudador”), é a regra do QPPQ, citarei somente as duas que se referem ao solicitante: - quem vai ser ajudado, assim como todos os envolvidos, devem QUERER receber essa ajuda; - quem vai ser ajudado, assim como todos os envolvidos, devem PEDIR a ajuda (o ato de pedir já é, por si só, transmissão de Axé, mas também serve para garantir que o item anterior seja verdadeiro e não que seja o querer de um terceiro). Se não for assim, não existirá ajuda, o que será feito é se intrometer, interferir na vida e no livre arbítrio e não será nem ajuda, nem Magia Branca. 

fonte:TUATO - http://www.tuato.com.br