quinta-feira, 3 de junho de 2010

Sobre o Sacerdócio na Umbanda (Compra de Coroa)

Com alguma regularidade, vemos médiuns de todo país  serem consagrados sacerdotes de Umbanda. Contam suas histórias, algumas bem “mirabolantes”, cheias de pirotecnia, mas a grande maioria também, não nos falam de tempo de trabalho em terreiro, orientações consistentes de guias e protetores e experiência mediúnica prática. Babalorixás consagrando médiuns com 1 ou 2 anos de trabalhos em novos Babalorixás. Babalorixás com pouquisimo tempo de coroa fazendo reforços de 7, 14 ou 21 anos, quando muitas vezes nem sabem rezar um Credo.
Geralmente falam que estão insatisfeitos com o terreiro em que se encontram, que o dirigente não tem conhecimento de causa, que não concordam com a forma como os trabalhos são dirigidos, se sentem colocados em segundo plano e/ou que receberam ordem de seu caboclo ou preto velho para abrir um terreiro.
Agravam-se estes queixumes quando os pretendentes à consagração sacerdotal não aceitam os ritos do terreiro que estão vinculados, achando-se melhor que todos os demais, preparados, coisa e tal. Não é incomum, imputarem ao chefe de terreiro como deve ser a sua vida pessoal fora do centro, num patrulhamento "moral" pior que o da inquisição, como se para estar a frente de um congá tivéssemos que ser um Francisco de Assis, Chico Xavier ou Gandhi. Muitas vezes, estas criaturas se preocupam mais com os outros que com elas mesmas, e por sua rigidez psicológica, acabam sendo eternos insatisfeitos, pois mudam regularmente de agrupamento e nunca encontram satisfação de suas almas, dado que condicionam ao exterior e aos outros sua felicidade e bem estar espirituais, esquecendo-se de olharem para dentro de si mesmos.
Alegam possuírem humildade, quando percebe-se claramente que é uma “falsa humildade”, pois estão, na realidade movidos pela vaidade, prepotência e/ou aspiração de poder e o status de pai ou mãe no santo. Ah! Se esses médiuns pudessem compreender as dificuldades e profundas responsabilidades que vem com esse pretenso “poder”!!!
Em função disso, resolvi escrever esse artigo que visa apenas chamar a atenção daqueles que acham ou acreditam que num passe de mágica se dá a coroação ou consagração de um sacerdote umbandista. Em primeiro lugar se deve deixar bem claro que Umbanda Consagra e que “fazer o Santo” não é ritual de Umbanda.
Aos que acreditam que a consagração se dá através apenas de vontade de ser consagrado, pode “tirar o cavalinho da chuva”, porque não se aprende em livros, cursos e escolas. Umbanda se aprende dentro do terreiro, em cada consulta, em cada gira, em cada atividade social, em cada louvação a Orixá. Nada substitui e nem é maior do que a bênção da orientação confirmada das entidades que nos orientam, e essa orientação sempre estará relacionada a maturidade mediúnica demonstrada pelo médium para com a sua banda e para com o trabalho da Umbanda, o que não ocorrerá da noite para o dia. Portanto, nada! Guia, protetor ou mentor algum irá dar essa orientação se o médium tiver recém ingressado nas linhas de trabalho da Umbanda. É necessário um tempo de preparação interiorizando- se a essência da umbanda, sua simplicidade, amor e caridade. Uma vez que todos eles – os Guias, Protetores e Mentores, sabem a importância para seus médiuns em vivenciarem as etapas necessárias no aprendizado até chegarem a uma Consagração Sacerdotal.
Na realidade existe uma “coisinha” que chamo de “coroa de chefia”. Trata-se apenas de um termo que uso para diferenciar os grupamentos de médiuns.
O termo Consagração quer dizer aprovação, ou seja, outorga espiritual da Banda que acompanha o médium, bem como da Cúpula Espiritual da Casa onde o médium faz parte da corrente. Quando chega a hora a entidade chefe do médium começa a sinalizar consistentemente que “alguma coisa” precisa ser feita. Lentamente, vai se formando no mental do médium os caminhos que deve trilhar para descobrir o que é essa “alguma coisa”. Através do tempo, da consistência de trabalho, tudo começa a ficar mais claro no mental do médium, que deve se dirigir ao seu sacerdote e dividir com ele as suas orientações (isso quando o seu próprio guia não o faz). Pai Pena Branca sempre fala que não adianta querermos avançar se não dominamos nem o simples, o trivial, o cotidiano.
Assim, com as devidas particularidades de cada um, aconteceu com todos os dirigentes consagrados no nosso terreiro. Todos trazem essa missão, todos trazem a “coroa de chefia” em seus oris. Todos passaram por ritos litúrgicos dentro do terreiro. E todos eles, mesmo com suas experiências individuais de anos de trabalho, tiveram humildade suficiente para ver a necessidade de serem consagrados. E mesmo assim, perseveraram! Isso é um fator determinante para ser um sacerdote da Egrégora. É aí que deve sempre nortear o caminho do médium o desejo sincero de servir, pois na sabedoria assim se diz: “Quando o discípulo está preparado o mestre aparece.”
Em nenhum deles  foi cobrado financeiramente ou materialmente. Entretanto, muito lhes foi exigido de dedicação, conhecimento, experiência e humildade mediúnicos, coisas que para eles foi absolutamente natural, pois traziam em seu ori e já eram de fato sacerdotes, só faltava serem de direito.
Esta preparação sacerdotal culminou no ato da benção com a mão sobre o coronário do consagrado, mas iniciou muito antes, encarnações e encarnações forjando o espírito para este momento existencial cármico de extrema responsabilidade. Por isto, não basta querer ser, "estar sacerdote". O espírito tem que SER verdadeiramente, vibrar em sua natureza de dentro para fora, para que o rito externo seja uma consolidação, um meio de ligação e assentamento no plano material de sérios compromissos espirituais assumidos de longa data pretérita.
Outro fator interessante de ser ressaltado é que nem todos que eu tenho a graça de visualizar a “coroa de chefia”, são para serem consagrados por essa egrégora, pois como nós sacerdotes sempre precisamos aprender mais e trocar conhecimentos, é necessário uma egrégora unida e para isso afinidade de pensamento e orientação missionária entre os mentores de cada Casa. É necessário que haja união, empatia e afinidade entre nós todos, os sacerdotes, pois apesar de eu ser o veículo utilizado materialmente pelo Alto para consagrá-los, não me posiciono “acima” deles, pois sou apenas o elo de ligação material entre todos. Quando os médiuns estão em sintonia com a Egrégora e fazendo juz a uma consagração por tudo o que já foi exposto acima, eles entenderão que muito mais que estar na Casa ou ser consagrado pela Sacerdotisa da Casa, ele em si é a própria Casa, são uma semente Dela, uma extensão da mesma. Sendo cada qual uma viga importante da viga mestra dessa construção. Então, nesse contexto, na Egrégora de Pai Pery, a vitória de um é a de todos.
Isso explica e justifica médiuns que saem do terreiro para serem consagrados em outras Casas e também os que buscam o terreiro e vemos (eu e/ou o médium) que não há afinidade de propósitos suficientes que o leve a ingressar nessa egrégora.  E entrar na Egrégora de Pery é atravessar um Grande  Portal, onde a senha para o mesmo é caridade, caridade, caridade. Por isso é bom cada qual refletir ante ao que o move.
Eu não brinco de consagrar dirigente! E não adianta ficar “batendo pezinho”! E nem sair falando que eu não tive competência de enxergar a sua “coroa de chefia” maravilhosa e o grande dirigente que eu “perdi”! Não estou aqui para agradar encarnado! Meu compromisso é com os guias, protetores, mentores e Orixás.  Até porque a sua “coroa de chefia” pode realmente ser maravilhosa, espetacular, linda de morrer, enorme, etc... Mas se não houver afinidade missionária, não dá prá ser. Se eu não receber ordem direta do Alto, não vai acontecer. Aí sugiro que procure outro sacerdote para consagrá-lo, sem magoas ou melindres. Até porque o verdadeiro futuro sacerdote não tem tempo a perder.
Temos que respeitar a afinidade de cada criatura. Afinal, na umbanda que praticamos um sacerdote não prescinde de ser médium, ao contrário de outras religiões e cultos, que a consagração sacerdotal não tem como pré-requisito a mediunidade. Assim, se o que te move ao encontro da insígnia sacerdotal são os títulos de mago, mestre, babalorixá, yalorixá,...; natural que deva procurar outro terreiro mais afim com seus anseios espirituais, mesmo que não seja na umbanda. Assim também muitos vêm para a umbanda de outros cultos, como o pólen das flores que se espalham num imenso jardim existencial, plasmado pela diversidade das almas neste planeta. Afinal de contas como dissera certa vez Pai Sete Flechas: “a Umbanda não é um show! E se há algum filho na corrente com essa intenção digo desde já, que está em local errado! Não tendo a Umbanda nascido ainda em seu coração.”
Minha preocupação maior sempre será manter essa egrégora unida para ser forte, pois não é objetivo da egrégora ter 200 terreiros filiados, mas sim a qualidade de trabalho, que só se dá com afinidade de propósitos de expandir a caridade, respeitando o livre-arbítrio de cada um, as orientações dos mentores de cada um, a experiência de cada um, tendo sempre em mente as orientações primeiras de Pai Pery, que são: jamais haver nenhum tipo de cobrança por nada sagrado (consultas, trabalhos, passes); por fugir completamente ao que se chama prática da caridade.
Portanto, não houve em nenhum dos casos fórmula mágica! Plim! Agora você é um sacerdote! Houve trabalho, muito trabalho antes disso. Eles foram médiuns de trabalho! Limparam terreiro (faxina mesmo), deram muita consulta, cuidaram muito dos terreiros que se desenvolveram. Nada foi de “mão beijada”, mas foi natural em suas vidas.
Com tudo isso explicado, espero que antes de nos procurarem em nossos terreiros  cheio de empáfia e vaidade (mesmo  que velada), achando-se ou sentindo-se melhor médium do que seus irmãos de caminhada, pensem e revejam mesmo se é isso que o Alto deseja. Veja se tem condições espirituais e financeiras de iniciar um terreiro, pois quando é prá ser, o Alto nos mostra o caminho e nos dá condições. Até porque o sacerdote não é melhor médium que ninguém, mas sim é o que mais tem a resgatar e a espiritualidade superior achou por bem lhe dar essa “coroa de chefia” para auxiliá-lo nesse resgate.
Para ser sacerdote consagrado pela egrégora do terreiro é preciso amar a Umbanda incondicionalmente, encarar a sua missão com seriedade, alegria e humildade. Ter a consciência de que está em nossas mãos o Futuro da Umbanda. O som do atabaque, a inspiração das curimbas, riquezas essas que não silenciaram nem sob chicotes, nem sob escravidão, nem sob a forma mais bruta e grotesca de homens que se diziam civilizados. Ter essa consciência é, acima de tudo, trazer e fazer no nosso tempo a alegria que foi roubada no passado. Entendendo que não somos melhores do que ninguém, mas sim os mais necessitados de amparo do Alto, para honrarmos a missão que nos foi confiada. Portanto, tem antes que aprender a ser médium! E aprender a ser médium não é só incorporar Guia, sentir vibração das energias-Orixás e dar consulta.  
Antes tem que aprender a ser gente.

Mãe Iassan
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2 comentários:

  1. DAR DE GRAÇA O QUE DE GRAÇA RECEBESTE, isso pra mim é tão claro, tão real, que só lembro desses (falsos religiosos) quando sou surpreendida com a pergunta; aqui cobra? quanto tem que pagar?
    já passei por um terreiro onde a mãe de santo atendia em dias especiais e cobrava a consulta!!! claro que sai correndo, NÃO COMPACTUO, NÃO DIVIDO, NÃO ACEITO… este tipo de coisa!

    Já ouvi diversos comentarios do tipo: paguei para aprender, não devo fazer de graça! pior! ja fiz cursos onde o mestre orientou que seja feito cobrança pelo trabalho!!!
    nem por isso vou cobrar! pois não acredito no acaso, se estudei e tive condições para bancar o estudo, essa condição me foi dada.
    quantas vezes se aproximava o dia de pagar eu não tinha a grana, e eu pensava Meu Deus como vou estudar mal da para pagar minhas contas!?!
    e no dia do vencimento fazia as contas, apertava aqui, ali! ih não é que deu para pagar!!!
    quantas vezes somos ajudados sem que percebamos? quantas vezes somos guiados pela espiritualidade, para estudarmos, adquirirmos conhecimeto para NOSSO BENEFICIO onde somos amparados por Eles SEM NADA COBRAR!?

    IDAÍ que paguei!
    quem me dar animo para levantar todos os dias para trabalhar?
    quem me diz acredita fia, toda vez que não acredito que vai dar?
    quem me diz confia, cada vez que digo: desta vez não…?
    quem me da saúde, coragem, proteção…?
    TUDO ISSO É COBRADO??? EU OS PAGO???
    DESDE QUANDO DEUS, ORIXÁ, GUIA… NOS COBRA POR TANTO QUE NOS FAZ?

    e por que nós cobrariamos por tão pouco que fazemos a os outros?!?!?!?!
    será que o que fazemos é mesmo para o outro?!??!?!

    SEI BEM QUANTO CUSTA MANTER UM TERREIRO!
    SEI QUANTO OS MEDIUNS FAZEM POUCO CASO COM O DEVER DE COLABORAR COM A CASA!

    HÁ OS QUE NÃO QUEREM SAIR DA CONDIÇÃO DE CONSULENTES PARA TRABALHADORES PARA NÃO PERDER O QUE TEM DE GRAÇA!
    (COMO SE UMA COLABORAÇÃO MENSAL DEIXASSE O SER MAIS POBRE)
    HÁ OS QUE PREFEREM COMER NA PADARIA DA ESQUINA!

    HÁ PESSOAS QUE TEM MANIA DE RECLAMAR, nossa tenho que comprar tanto remedio… pagar o taxi pra levar meu marido ao medico…ai meu filho ta precisando de ajuda, mas não tenho dinheiro pra pagar o onibus… mas se bobiar aplica na poupança todos os meses!!

    NÓS “LIDERES” RELIGIOSOS TEMOS QUE MUDAR ISSO!
    NADA DE DESCULPAS PARA COBRANÇAS!
    NADA DE Tá DIFíCIL!

    SABE AQUELE VELHO DITADO: DEUS NÃO DA A CARGA MAIOR DO QUE O BURRO CONSEGUE CARREGAR!
    É ISSO AI!!!

    AXÉ A TODOS…
    MUITA LUZ EM NOSSA CONSCIÊCIA…

    Edna Melo

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  2. Todos nós recebemos dons dos orixás para realizarmos algum feito. Por este motivo existem médicos, professores, cientistas, pintores, construtores, etc. Todos receberam gratuitamente este dom divino e no entanto cobram para exercer sua profissão. Porque nós, sacerdotes não devemos cobrar? A exploração em qualquer profissão é que deve ser condenável. No entanto acredito que cobrar para dar coroa é redundante. Pois todos nós nascemos com o chakra coronário(da coroa), presente no topo de nossas cabeças. Se pensarmos bem todos já nascemos coroados. Precisamos sim buscar o aprendizado e o conhecimento para por em prática nosso dom. Assim como o médico estuda para cuidar do corpo, nós, que cuidamos da alma, também devemos assumir essa responsabilidade. O que falta mesmo entre os religiosos é seriedade e responsabilidade.
    muita luz do raio de iansã à todos, que minha mãe ilumine e guie todos nós.
    Karla d'oyá

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